Descanso adiado

Já faz um tempo que sabemos que o conceito de aposentadoria mudou. Há pelo menos três razões para isso: vamos viver mais tempo, a medicina vai nos proteger da maioria dos males que matavam antigamente e temos hoje a consciência de que a renda vitalícia do INSS não vai bancar o padrão de vida ao qual estamos acostumados. Mesmo assim, sei que muita gente ainda fica em dúvida sobre a hora de parar. E a palavra 'parar' aqui não está sendo usada no sentido de ir para casa assistir à sessão da tarde. Significa, em vez disso, transformar um trabalho em tempo integral em algo part-time, que permita ganhar algum dinheiro e melhorar a qualidade de vida.

Uma vez que a palavra aposentadoria está, digamos, sendo aposentada, a pergunta que atiça minha mente é: qual é a idade certa para fazer a transição de vida? Nos Estados Unidos, o Employee Benefit Research Institute (EBRI), com sede em Washington, roda anualmente uma pesquisa sobre o grau de confiança dos americanos na aposentadoria. Os resultados do ano passado mostram que um em cada três trabalhadores deseja se manter no mercado de trabalho até os 70 anos ou mais. E a principal razão para isso é a desconfiança em sua capacidade de viver confortavelmente até o fim da vida. Por outro lado, apenas um em cada dez quer parar antes dos 60. No Brasil, Cleber Nicolav, superintendente da Inovar Previdência, uma instituição de previdência privada com 30 anos de mercado, começou a notar algo diferente no comportamento dos seus clientes nos últimos anos: pessoas que já poderiam estar se beneficiando da poupança feita ao longo da vida corporativa estão adiando o início da retirada. Na Inovar, os saques mensais podem começar aos 55 anos, mas 10% da sua base de clientes estão quietos, adiando o resgate. "Temos casos de pessoas com mais de 65 que ainda não requisitaram o benefício", diz Nicolav. "Pode ser que estejam acumulando enquanto ainda têm disposição para o trabalho ou pode ser que não estejam precisando desse dinheiro, mas uma coisa é certa: sabem que vão viver mais e que a poupança de agora fará diferença lá na frente."

Trabalhar mais tempo é a chave para garantir o conforto nas últimas décadas de vida, mas o fato é que não existe uma regra única sobre até quando é preciso acumular. Nicolav indica duas perguntas cujas respostas são de foro íntimo de cada pessoa: você se sente financeiramente seguro? A mudança vai ter impacto positivo na sua qualidade de vida? Tomada a decisão de usufruir, há outra questão importante: você quer gastar toda a poupança acumulada enquanto está vivo ou pretende deixar um pé de meia para os descendentes? A resposta vai indicar o percentual mensal do patrimônio que pode ser transformado em renda. No caso da previdência privada, para quem deseja proteger sucessores, Nicolav diz que o percentual mágico de 0,7% garante o sustento pelo resto da vida e ainda deixa o principal para os herdeiros (estimativa sujeita, claro, à situação geral da economia). Por outro lado, se retirar 2,5% do patrimônio todo mês, o saldo acaba em poucos anos. Guardar ou gastar, eis a questão!

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