Moradora de Sapopemba, na periferia de São Paulo, Beatriz Zeballo, 20, foi a primeira de sua família a entrar na faculdade, em 2020. Escolheu estudar filosofia, curso citado por "professores fantásticos" que teve no ensino médio, em uma escola pública na Vila Prudente, na zona leste da capital paulista. "Com eles aprendi humanidade de um jeito lindo."
No terceiro semestre do curso na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), porém, ela precisou trancar a matrícula. "Não tive oportunidade de sonhar, de estudar. Não foi diferente para minha mãe, para meu pai, para minha avó. Por que seria diferente pra mim?", lamenta.
Durante dois anos, Beatriz conseguiu se manter nos estudos, apesar das dificuldades. Nos primeiros meses de aula, estagiou num museu como monitora, mas, com o início da pandemia, em março de 2020, precisou procurar outro emprego. Tinha de ajudar a mãe nas despesas de casa. Juntas, passaram a trabalhar em uma confecção no Bom Retiro, no centro de São Paulo.
Na época, o ensino foi para o formato online, mas sem plataforma adequada, relata. A situação se agravou com o retorno ao modelo presencial na universidade, em 2022: além de levar quase duas horas no caminho entre o trabalho e o campus de Guarulhos, sem auxílio para transporte, a estudante gastava cerca de R$ 240 por mês com passagens de ônibus.
Beatriz divide com a mãe as contas da casa onde também vivem seus dois irmãos mais novos. "Tenho que ajudar no aluguel, que custa R$ 900. Tenho um irmão com deficiência, precisamos pagar psicólogo e pedagogo, não temos ajuda do governo."
Ela decidiu trancar o curso porque não estava mais conseguindo conciliar os estudos e o trabalho. "Sonhava que ia ser pesquisadora, uma menina preta, pobre, na filosofia, uma área com tanto homem branco", diz. Para ela, o sonho acabou. "Até hoje dá vontade de chorar."
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